O Art. 38 da Lei 14.735, de 23.11.23, diz que, quando da criação do novo cargo único:
“Os cargos efetivos atualmente existentes na estrutura da Polícia Civil serão transformados, renomeados ou aproveitados (em lei do respectivo ente federativo), respeitadas a similitude e a equivalência de atribuições nas suas atividades funcionais.”
A respeito, legalmente temos as seguintes situações:
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Sendo o novo cargo proposto um aglutinador de todas as diferentes e específicas atribuições legais dos atuais cargos de Agentes PCs do RS, quais sejam os de Investigador de Polícia, Inspetor de Polícia, Escrivão de Polícia, Comissário de Investigação Policial e de Comissário de Polícia, o cogitado novo cargo a ser criado obviamente seria outro cargo, diferente em atribuições de qualquer outro atual.
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Isso significa, obviamente, provimento derivado, que vem a ser a investidura em cargo público sem concurso ou observação de mesma escolaridade, objeto da Súmula Vinculante 43 do Supremo Tribunal Federal, que inclusive já invalidou a transformação havida aos Investigadores de Polícia de nosso Estado.
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Embora o novo cargo previsto possua “nível superior”, a hipotética transformação estaria vedada novamente aos atuais Investigadores de Polícia, em vista da diferente escolaridade formal, vez que sua carreira, em extinção, legalmente não o possui.
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Em consequência de uma imaginária criação do novo cargo de Investigador de Polícia, acrescido do termo “Oficial”, também restariam prejudicados todos os demais atuais ocupantes de cargos policiais civis do Estado do Rio Grande do Sul, pois que, impedidos da transformação inconstitucional por provimento derivado, teriam seus cargos e carreiras extintas, com perda de referência remuneratória.
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Especialmente a referendar o equívoco redacional do Art. 38 em causa, tem-se que todos os parágrafos desse mesmo artigo foram vetados por inconstitucionalidade, expressamente dada por provimento derivado e interferência indevida na competência privativa de chefes de poderes executivos (estaduais e do Distrito Federal).
As razões dadas pelo Executivo (e acolhidas pelo Congresso Nacional) a todos os parágrafos do Art. 38 são as seguintes:
“Em que pese a boa vontade do legislador, pontua-se que a proposição legislativa é contrária ao interesse público, pois versa sobre regras específicas que possibilitam investidura em cargo público via provimento derivado, implicando interferência indevida na organização político-administrativa do ente federado, inclusive em matérias de competência privativa de chefes de poderes executivos, com impacto sobre o equilíbrio federativo.”
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O contido nos parágrafos do Art. 38 tornados inexistentes na Lei Orgânica das PCs por inconstitucionalidade reconhecida são os seguintes:
Parágrafo primeiro do art. 38 – “Os atuais cargos podem ser renomeados com a nova nomenclatura mesmo quando não houver similitude de função (atribuições legais) e com as devidas aglutinações dos cargos conforme conveniência da administração pública.” – Vetado por inconstitucionalidade (provimento derivado e interferência na competência do Estado).
§ 2º do art. 38 – “Aplicado o parágrafo primeiro deste artigo, os atuais servidores podem optar por permanecer no seu cargo.” – Vetado por inconstitucionalidade (interferência na competência do Estado).
§ 3º do art. 38 – “Se aplicada a renomeação, os aposentados devem ter seus cargos renomeados para ‘oficial investigador’, preservados seus direitos previdenciários e dos respectivos pensionistas.” – Vetado por inconstitucionalidade (provimento derivado e interferência na competência do Estado).
§ 4º do art. 38 – “Os cargos já extintos ou em extinção (investigadores) serão aproveitados ou renomeados para o cargo de ‘oficial investigador de polícia’ por similitude de função ou aglutinações de funções, observados os princípios de ‘modernização legislativa’.” – Vetado por inconstitucionalidade (provimento derivado e interferência na competência do Estado).
Sendo assim, para tranquilidade dos atuais Agentes (Investigador de Polícia, Inspetor de Polícia, Escrivão de Polícia, Comissário de Investigação Policial e de Comissário de Polícia) Policiais Civis de nosso Estado, ativos e inativos, não resta dúvida de que a transformação compulsória dos seus atuais cargos é impossível de ocorrer, por absoluta inconstitucionalidade, além de ser inviável o novo cargo proposto, que aglutinaria funções legais e cuja criação estaria sob a competência federativa do nosso Estado.
Apesar de o Governo do Estado do RS não haver ainda se ocupado oficialmente do assunto, podemos adiantar que, em entrevista com o Exmo. Sr. Procurador-Geral do Estado, esta ACP/RS obteve claros indicativos de concordância em relação à inconstitucionalidade das transformações aventadas.
A propósito, a ACP/RS oficiou em setembro à Chefia de Polícia, buscando manifestação competente do Governo Estadual acerca do entendimento oficial da matéria, em vista de suas possíveis consequências danosas aos servidores policiais alvo do tumultuoso e surpreendente Art. 38 da Lei Orgânica, aliás baixada de modo inesperado.
Entretanto, nesse meio tempo, temos que o Governo do Estado do RS fez publicar no Diário Oficial de 24 de outubro último o Edital nº 06/2025 da Academia de Polícia Civil, sobre a abertura de Concursos Públicos de Ingresso nas Carreiras de Escrivão de Polícia e de Inspetor de Polícia, para preenchimento inicial de 360 vagas em cada cargo. De acordo com os itens 2.3.1 e 2.4.1 do Edital, as atribuições permanecem bem distintas entre si.
Este fato, a nosso ver, demonstra o posicionamento legal do Estado do RS quanto ao Art. 38 da Lei Orgânica das Polícias Civis.
Por fim, importa referir — a todos os integrantes das atuais carreiras ativas de Agentes Policiais Civis —, cujas carreiras são hierarquizadas, que o cargo de Comissário de Polícia é seu final de carreira a ser preservado e valorizado como chefia intermediária entre o quadro de Agentes e as respectivas Chefias de Delegados de Polícia, algo essencial a toda e qualquer instituição hierarquizada como a nossa.